A despedida


Quando cheguei naquele hospital, minha orientadora apresentou-nos e logo após contou os motivos de seu internamento naquela unidade hospitalar. Foi simpatia a primeira vista. Aquele jovem de trinta e dois anos, porte mediano, olhar cansado, era a personificação da doçura.

Sempre às quintas-feiras, eu estava lá para nossas sessões de fisioterapia. Sua história baseada no etilismo, lesionou uma parte do sistema nervoso, o que levou a falta de equilíbrio. Ele não sentava, andava, para comer era um dilema, porque todo seu corpo tremia e além disso, ele era soro-positivo para HIV. Porém, ao invés da agressividade, da revolta, da negação, encontrei naquela criatura, a perseverança e a certeza de poder vencer.

Muitas vezes ele se entristecia... Queria voltar para casa e pensava que ia morrer ali naquele leito. Reclamava de sua voz, que por conta dos distúrbios causados pelo álcool, ficara alterada e não conseguíamos entender muito bem o que ele falava. Mas mesmo com essa tristeza, ele continuava.

Com o tempo, reestabeleceu o equilíbrio, passou a alimentar-se sozinho, as palavras já eram entendidas e chegou a hora de partir...

Para o paciente, não existe hora melhor que a alta. Para o terapeuta, significa o término de um ciclo, mas confesso que não deixamos de nos emocionar. Sua última sessão fora apenas sorrisos e brincadeiras que ele fazia com os funcionários do hospital.

Enfim, chegou o dia de sua saída e fui até a sua enfermaria. Ele me olhou tão feliz e antes que ele articulasse qualquer palavra, eu já sabia que o motivo de sua felicidade era a volta para casa.

Olhei aqueles olhos esperançosos, e confesso que marejei os meus de lágrimas. Apertei aquelas mãos ainda um pouco trêmulas e senti a firmeza de uma nova vida.

Sentindo minha preocupação com seu porvir, ele me acalmou: "Eu vou ter cuidado, me converti".

É impossível descrever o que eu sinto até agora porque tudo está muito misturado aqui dentro. A única certeza que tenho, é que escolhi a profissão certa porque na área da saúde, é preciso amar primeiro as pessoas. Um amor sem preconceitos, sem amarras, sem pieguismos.

Aprendi com aquele paciente que a vida segue e mesmo ante todas as adversidades encontradas, tudo podemos, basta acreditar.


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As vezes uma brisa, as vezes um livro, as vezes uma música, as vezes um sorriso, as vezes uma lágrima, as vezes tudo, as vezes nada e sempre uma contradição.